No plano espiritual, nossa essência existe em estado de completude absoluta. Somos seres íntegros, perfeitos e plenos. Nada nos falta nessa dimensão de pura consciência. Entretanto, ao mergulharmos na realidade material da Terra, algo paradoxal acontece: para vivermos de forma verdadeiramente saudável aqui, precisamos aceitar e até cultivar uma parcela de não integração em nosso ser.
Essa fragmentação começa no momento da reencarnação. Desde o útero materno, iniciamos um processo de coleta de experiências, informações e impressões que vão se agregando ao nosso ser de maneira naturalmente fragmentada. São pedaços de vivências, sensações, memórias e aprendizados que ainda não formam um todo coeso. É como se estivéssemos montando um quebra-cabeça complexo, peça por peça.
Quando nascemos, se formos bem acolhidos por cuidadores atentos e amorosos, eles nos ajudarão no delicado trabalho de integrar essas partes fragmentadas. Os pais ou responsáveis funcionam como espelhos e organizadores psíquicos, dando sentido e coesão às nossas experiências iniciais. Porém, se esse acolhimento falha, permanecemos desintegrados, vivendo em estados de angústia e confusão que podem se estender pela vida toda.
Mesmo aqueles que tiveram a bênção de crescer em ambientes suficientemente bons não estão imunes. Ao longo da jornada terrena, todos nós enfrentamos sucessivas desintegrações causadas por traumas, perdas, crises e transformações. Nesses momentos, frequentemente necessitamos do suporte de um terapeuta que, simbolicamente, fará o papel daquela mãe integradora, ajudando-nos a recolher e reorganizar nossos fragmentos dispersos.
Mas aqui está a grande verdade que muitos resistem em aceitar: é impossível viver na Terra de forma completamente integrada como vivíamos no mundo espiritual. A materialidade exige outra configuração. A vida aqui é essencialmente bipolar, dual, paradoxal – tudo possui dois lados, duas faces, dois polos. Pretender viver neste plano com a mesma integração total do plano espiritual é uma ilusão que gera sofrimento.
Para sermos verdadeiramente saudáveis, felizes e prósperos na Terra, precisamos manter um equilíbrio aproximado: cerca de cinquenta por cento integrados e cinquenta por cento desintegrados. A parte integrada nos permite enxergar a vida de forma objetiva, racional e realista – é ela que nos ancora na materialidade, nos ajuda a cumprir compromissos, seguir regras e funcionar socialmente. Já a parte desintegrada nos conecta com o imaginativo, o fantasioso, o criativo – é ela que nos mantém vivos espiritualmente, capazes de sonhar, criar e transcender.
Quando esse equilíbrio se rompe em favor da integração excessiva, surge a neurose obsessiva. São pessoas que desenvolveram um medo patológico da não integração, frequentemente por terem experimentado na infância o terror da fragmentação. Apegam-se desesperadamente à ideia de completude, perfeição e controle total. No fundo, sua alma deseja continuar vivendo na plenitude do mundo espiritual, mas se decepcionam continuamente com um mundo cheio de regras, limites e imperfeições que aprisionam a livre expressão do ser.
Obsessivos vivem aterrorizados pelo erro, pela falha, pela transgressão. Não sobra espaço para ousar, experimentar ou abraçar um pouco da loucura necessária à vida. Curiosamente, essas pessoas tendem a ter imenso medo do mundo espiritual, do invisível, do sobrenatural. E aqui reside uma verdade profunda: quem tem medo de espíritos tem medo de si mesmo, pois somos, em essência, seres espirituais. Obsessivos podem aparentar normalidade, mas é uma normalidade excessiva, estéril. Quando sentem desconforto diante da espontaneidade ou “loucura” dos outros, esse é o sinal de que adoeceram.
No polo oposto, encontramos aqueles que tiveram dificuldade de integrar suas partes fragmentadas no início da vida. Quando adultos, ao passarem por crises significativas, podem experimentar regressões ao estado original de não integração primária do bebê, manifestando graus variados de psicose. Paradoxalmente, o que falta a essas pessoas é exatamente o que sobra no obsessivo. Não por acaso, o estado de não integração tende a facilitar a conexão com o mundo espiritual. Muitos médiuns vêm de lares mais humildes ou não desenvolveram fortemente seus aspectos intelectuais. São frequentemente pessoas criativas, dotadas de sensibilidade artística e dons especiais.
A saúde verdadeira está no equilíbrio dinâmico entre materialidade e espiritualidade, entre integração e não integração. Pessoas saudáveis não têm medo de experiências temporárias de fragmentação – errar, falhar, fracassar não as aterroriza, pois possuem um ego suficientemente forte e flexível para atravessar as vicissitudes da vida. São capazes de transitar conscientemente entre esses dois estados, canalizando ideias, insights e informações do mundo espiritual para o material, contribuindo assim com inovações genuínas para a evolução da Terra e da humanidade.
Paula Teshima