Grande parte das pessoas vive submersa em um esforço constante para se adaptar às normas e exigências sociais, muitas vezes sem questionar se tais regras realmente fazem sentido ou se refletem seus próprios valores. Essa submissão não é, na maioria das vezes, fruto de reflexão crítica ou de uma escolha racional consciente. Ao contrário, ela emerge de um impulso mais profundo, enraizado no narcisismo primário: o desejo intenso de se perceber como perfeito, correto e irrepreensível aos olhos dos outros. Trata-se de uma tentativa de recuperar uma sensação de completude e valorização que, muitas vezes, não foi plenamente experimentada durante a infância.
O mecanismo funciona como um jogo social invisível. Ao se submeter às expectativas externas, ao cumprir regras e demonstrar comportamentos “adequados”, o indivíduo busca aprovação e reconhecimento. Cada elogio, cada gesto de validação, reforça a ilusão de perfeição e, momentaneamente, preenche o vazio interno. Porém, essa sensação de completude é sempre passageira. A exigência de corresponder continuamente a padrões externos é extenuante, porque a pessoa nunca se sente realmente suficiente. Quanto mais se esforça para agradar ou para parecer impecável, mais distante se torna de sua própria autenticidade.
Essa dinâmica revela a face sombria de um narcisismo mal resolvido. A busca incessante por aprovação externa é, na essência, uma forma de compensar carências antigas. O indivíduo deseja ser admirado, não por quem ele é de fato, mas pela imagem idealizada que apresenta aos outros. Cada gesto, cada decisão, cada palavra é cuidadosamente moldada para corresponder a esse padrão externo de perfeição. É como se a vida fosse um palco, e o sujeito, um ator que nunca pode se permitir errar, fraquejar ou mostrar vulnerabilidade.
Em contrapartida, existem aqueles que escolhem conscientemente não entrar nessa competição social. Essas pessoas renunciam, de forma deliberada, aos desejos narcísicos de perfeição e validação externa. Esse caminho não é marcado por apatia ou negligência; trata-se, na realidade, de uma decisão profunda de priorizar a autenticidade sobre a aparência, a espontaneidade sobre a aprovação, a liberdade sobre a submissão. Ao abdicar da necessidade de corresponder aos padrões alheios, elas se libertam da pressão constante de estar à altura de expectativas irreais.
Essa renúncia oferece um tipo particular de liberdade. A pessoa passa a habitar sua própria existência, experimentando emoções e escolhas sem a preocupação constante com o julgamento externo. A espontaneidade e a criatividade florescem porque não estão mais contidas pelo medo de não corresponder ou de ser criticada. A autenticidade se torna uma prática diária, uma forma de viver que valoriza o contato profundo consigo mesmo e com a realidade, em vez de buscar validação em reflexos externos.
Além disso, ao renunciar à busca por perfeição, o indivíduo aprende a aceitar suas imperfeições e vulnerabilidades como partes essenciais de sua humanidade. A liberdade conquistada não é a ausência de regras ou responsabilidades, mas a possibilidade de existir plenamente, sem máscaras. Essa escolha consciente transforma a vida em um espaço de aprendizado, de autoconhecimento e de experiências genuínas, em vez de um campo de batalha onde o valor pessoal depende da aprovação alheia.
Portanto, a diferença entre aqueles que se submetem cegamente às normas sociais e os que renunciam à tirania da perfeição está, em última análise, na consciência de sua própria motivação. Enquanto os primeiros buscam externamente a sensação de completude que lhes falta, os segundos constroem internamente um senso de valor que não depende do olhar alheio. Libertar-se do narcisismo externo é, paradoxalmente, o caminho para recuperar a liberdade, a criatividade e a autenticidade que toda pessoa genuinamente deseja viver.
Paula Teshima