Neuróticos e Psicóticos Vivem Fugindo do Seu Passado

Tanto o neurótico quanto o psicótico carregam uma coisa em comum: infâncias difíceis. Ambientes que não foram suficientemente bons. Pais que falharam em cuidar, proteger, acolher. Eles cresceram sentindo rejeição, abandono, solidão. Sabe como uma criança lida com uma dor que é grande demais para caber nela? Fugindo. Criando um mundo onde tudo é como deveria ser.

O neurótico foge para dentro da própria cabeça. Constrói fantasias perfeitas onde a vida é boa, harmoniosa, sem conflitos. Passa horas imaginando cenários ideais, relacionamentos perfeitos, conquistas grandiosas. Mas não faz nada para tornar isso real. Apenas sonha. E enquanto isso, a vida real — cheia de frustrações, perdas, imperfeições — continua acontecendo. Mas ele finge que não vê. Simplesmente ignora o que não quer encarar.

O psicótico vai além. Ele não só finge que a realidade é outra — ele acredita nisso. Rompe completamente com o que está acontecendo e mergulha em delírios e alucinações. Só que essas fantasias não são boas. São sombrias, persecutórias, angustiantes. É o conteúdo rejeitado voltando de forma distorcida. Ele vive assombrado justamente por aquilo que tentou não ver.

A diferença entre eles está na gravidade do trauma. O neurótico geralmente viveu numa família repressora, controladora, onde não podia ser quem era. Já, o psicótico viveu algo mais brutal — violência física, abusos, negligência severa. A realidade do psicótico é insuportável. A do neurótico é apenas desagradável. Por isso, o psicótico precisa de uma fuga mais radical.

O neurótico é covarde. Ele não enfrenta, não reclama, não age. É passivo-agressivo. Engole tudo e depois somatiza — transforma conflitos emocionais em sintomas físicos. Já, o psicótico é ativo. Ele reage, muda, age. Só que ele altera para uma realidade caótica — a da sua própria mente, não a do mundo externo.

E ambos têm algo em comum: um ego frágil demais. Não conseguem lidar com adversidades normais da vida. Um problema pequeno vira catástrofe. Uma rejeição comum se torna prova de que não são amados. Vivem num corpo de adulto com uma mente de criança assustada.

O neurótico, no fundo, quer viver só coisas boas. Sofreu demais no passado e agora se sente merecedor de uma vida perfeita. Mas sem pagar o preço. Quer que tudo chegue de graça, sem esforço, sem trabalho. Acredita que se for certinho, obediente, boazinho, Deus ou o universo vão recompensá-lo. Esquece que está aqui para agir, arriscar, construir. Não basta sonhar — é preciso fazer acontecer.

Enquanto isso, continua preso no mundo das fantasias. E quanto mais se apega a elas, mais a realidade o frustra. É um ciclo vicioso. O irônico é que se ele parasse de fugir e começasse a enfrentar o que dói, ele estaria justamente se aproximando da vida boa que tanto deseja.

Freud dizia algo interessante: para lidar bem com a realidade, precisamos combinar aspectos da neurose e da psicose. Por exemplo, você quer ir para a Austrália mas não tem dinheiro. O neurótico aceitaria o impedimento passivamente. Já o psicótico buscaria mudar a situação — trabalhando, economizando, agindo. A chave é não aceitar passivamente as frustrações, mas também não fugir delas. É olhar, reconhecer e buscar soluções reais.

A pessoa saudável faz isso. Ela também tem fantasias, mas não vive nelas. Ela aceita que a vida é frustrante às vezes. Que há perdas, falhas, dores. E usa essas frustrações como combustível para agir. Ela tem um ego forte — não porque nunca sofreu, mas porque aprendeu a lidar com o sofrimento.

O caminho de cura, tanto para o neurótico quanto para o psicótico, é fortalecer o ego. Olhar para o que foi rejeitado. Reintegrar as partes que foram deixadas de fora. E principalmente: sair do mundo da imaginação e começar a agir no mundo real. Porque é aqui, na matéria, que a vida acontece. E é aqui que podemos, de fato, manifestar nossos desejos para obter aprendizados, crescimentos e evoluções.

Paula Teshima

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