O melancólico nasce com olhos voltados para dentro, como quem escuta o mundo pelo eco de sua própria mente. Desde cedo, aprende a caminhar em silêncio, a perceber sombras onde outros veem luz, a sentir profundamente o peso de cada emoção. Mas esse olhar sensível é também vulnerável: há um tirano invisível dentro dele, uma voz severa que julga cada gesto, cada pensamento, cada desejo. É o superego, o ego negativo, a criança interior que não foi suficientemente amada, que acredita que a dor é merecimento e a culpa, lei.

Quando se entrega a essa sombra, o melancólico se encolhe. Cada pensamento se torna autoacusação, cada emoção se transforma em tormento. Ele se vê pequeno, insuficiente, incapaz de corresponder aos padrões impossíveis que lhe foram ensinados ou que ele mesmo internalizou. O mundo externo pode ser leve, colorido, vasto — mas dentro dele, há gelo, silêncio e aço. Ele aceita tudo, se chicoteia com suas próprias expectativas, e é como se cada lágrima fosse uma punição necessária; cada suspiro, uma confissão de fracasso.

Mas a vida do melancólico não é apenas sombra. Há momentos, raros e fulgurantes, em que a maré muda. Uma luz tênue atravessa sua penumbra, e ele sente o chamado do eu superior, aquela dimensão de sua alma que é infinita, plena, sagrada. De repente, a dor se transforma em energia, e ele se percebe vasto, potente, capaz de qualquer coisa. É a megalomania, mas não de soberba comum; é a identificação quase literal com a perfeição que habita dentro dele. Ele sente-se Deus em carne humana, tocando a eternidade com cada gesto, cada pensamento, cada pulsar do coração.

Nesse estado, o superego se recolhe. A criança ferida cala-se. O melancólico incorpora a luz do eu superior, e por um instante, não há dúvida, não há limitação, não há medo. Ele é completo. Mas é justamente nesse instante que mora o perigo: confundir-se com o divino é esquecer-se de ser humano. A onipotência percebida pode ser sedutora demais, e a exaltação pode cegar.

É aqui que a verdadeira dança começa. Entre a sombra e a luz, entre o superego e o eu superior, o melancólico aprende — lentamente — a habitar o meio. Descobre que não é preciso se perder na megalomania nem submeter-se eternamente à melancolia. O eu superior pode inspirar sem dominar, orientar sem substituir, guiar sem apagar. O superego pode existir, mas não como tirano; pode existir como lembrete, como um guardião que ensina limites sem esmagar a alma.

Quando consegue equilibrar-se, o melancólico percebe que a grandeza não está em ser perfeito, nem em ser poderoso. A verdadeira grandeza está em integrar todas as suas partes: a criança ferida, o ego crítico, o humano limitado e o eu superior. Entre a dor e a exaltação, entre o medo e a coragem, ele descobre que a vida não é apenas existir, sentir ou pensar, mas oscilar com consciência, aceitar a sombra, admirar a luz, e dançar entre ambas.

E assim, o melancólico caminha. Não como anjo nem como tirano, não como Deus nem como vítima, mas como humano desperto, inteiro, vivo. Cada passo é ato de coragem, cada pausa, momento de sabedoria. Entre melancolia e megalomania, entre sombra e luz, ele encontra a paz que não se entrega a extremos, mas que floresce no equilíbrio. O melancólico aprende, enfim, a arte suprema de ser ele mesmo: limitado e grandioso, humano e divino, sombrio e luminoso — completo.

Paula Teshima