Talvez, a angústia que certas pessoas sentem tenha origem em algo muito mais profundo do que simples insatisfação com a vida ou incapacidade de lidar com as frustrações cotidianas. Em muitos casos, trata-se de uma dificuldade genuína de integração com os aspectos materiais da existência terrena. Há almas que, ao encarnar, parecem não conseguir se adaptar plenamente à densidade da vida física. Vivem como estrangeiras no próprio planeta, sentindo que não pertencem a este mundo.

Essas pessoas têm grande sensibilidade, percebem o invisível, são movidas por ideais de beleza, amor e liberdade. Buscam algo que transcenda o imediato, o prático e o palpável. Por isso, o ritmo do mundo — com suas obrigações, limites, cobranças e imperfeições — muitas vezes lhes parece árido e opressor. Não compreendem por que precisam se submeter a tantas regras, por que é necessário lutar tanto por coisas que lhes parecem superficiais. E, quando se deparam com a dureza da realidade material, o sentido da vida começa a escapar por entre os dedos.

A matéria, para elas, é como uma prisão. O corpo pesa. As responsabilidades pesam. O tempo pesa. Tudo o que é limitado, concreto e estruturado lhes causa desconforto. Essas almas anseiam por algo que não encontram neste plano — um tipo de liberdade, de comunhão e de amor que transcende qualquer experiência humana. Por isso, sentem uma saudade profunda que não sabem explicar. Uma nostalgia que parece vir de um lugar longínquo, de uma dimensão anterior, onde tudo era mais leve e harmonioso.

Essa saudade espiritual, muitas vezes inconsciente, pode se manifestar como um vazio existencial. A pessoa não entende o porquê de sua tristeza. Tem tudo para estar bem, mas não está. Vive um tipo de melancolia silenciosa, como se sua alma soubesse de algo que a mente humana esqueceu. É a dor de quem ainda não conseguiu se reconciliar com o fato de estar na Terra — um planeta-escola, onde o espírito aprende, amadurece e evolui justamente através dos desafios da matéria.

No entanto, o problema não está em ser espiritual. A espiritualidade, quando integrada, é fonte de sentido, paz e plenitude. A dificuldade surge quando o indivíduo se refugia no espiritual para evitar o contato com a realidade concreta. Quando idealiza demais o “mundo de onde veio” e rejeita o “mundo onde está”. Esse desajuste produz uma cisão interna: o corpo vive aqui, mas a alma permanece ausente, sonhando com outro lugar. E é justamente essa divisão que gera angústia, confusão e sensação de não pertencimento.

Na psicanálise, poderíamos dizer que a energia psíquica da pessoa está “desinvestida” do mundo real. Em vez de investir libido — energia vital — nas relações, nos projetos e nas experiências terrenas, ela a direciona para o imaginário, para o espiritual, para o simbólico. E, sem investimento no aqui e agora, a vida perde cor, textura e significado. A pessoa se sente desconectada, flutuando entre planos, sem enraizamento.

Por outro lado, o despertar espiritual verdadeiro não rejeita o mundo material — ele o inclui. O espírito desperto compreende que a matéria é o palco onde o divino se manifesta. Que cada gesto cotidiano, cada desafio e cada encontro humano são oportunidades de expressar e concretizar o amor que, em essência, ele já é. O despertar não é uma fuga do mundo, mas uma nova forma de habitá-lo, com mais consciência, leveza e gratidão.

Quando essa integração começa a acontecer, a percepção muda completamente. O corpo deixa de ser uma prisão e passa a ser um instrumento sagrado. O trabalho deixa de ser um fardo e se torna um meio de expressão. A vida material deixa de ser um castigo e se revela como um campo fértil de aprendizado. Tudo ganha propósito quando o olhar espiritual se alia à experiência humana.

A angústia, então, deixa de ser inimiga e passa a ser uma mensageira. Ela indica que algo dentro de nós pede reconciliação. Que talvez tenhamos nos afastado demais do mundo ou de nós mesmos. Que é hora de sair do mundo das ideias e colocar os pés no chão, sem perder a conexão com o alto. O equilíbrio não está em escolher entre o espírito e matéria, mas em permitir que ambos coexistam em harmonia dentro de nós.

Afinal, estamos aqui para unir o que o medo separou. Para compreender que o sagrado também habita o comum. Que a Terra, com toda sua densidade, é tão divina quanto o plano espiritual de onde viemos. E que o verdadeiro despertar não é recordar o lugar de origem, mas aprender a manifestar essa lembrança luminosa neste plano, agora, através da vida que nos foi concedida.

Quando o espírito aceita plenamente sua encarnação, a angústia se transforma em sabedoria. O vazio se preenche de sentido. E a saudade do infinito se converte em presença amorosa — a consciência tranquila de quem finalmente entendeu que estar na Terra também pode ser uma forma de paraíso celestial.

Paula Teshima